Índio do Xingu, Elvis da Silva, 2005
O Dilúvio Brasileiro
(José de Alencar, O Guarani)
"Foi longe, bem longe dos
tempos de agora.
As águas caíram e
começaram a cobrir toda a terra.
Os homens subiram ao alto
dos montes.
Só um ficou na várzea
com sua esposa: era Tamandaré.
Forte entre os fortes,
sabia mais que todos.
Tupã falava-lhe de noite.
E de dia ele ensinava aos filhos da tribo o que aprendia do deus.
Quando todos subiram aos
montes, ele disse:
Ficai comigo, fazei como
eu e deixai que venha a água.
Os outros não o
escutaram e foram para o alto.
Ele ficou só, na várzea,
com sua companheira, que não o abandonou.
Tamandaré tomou sua
mulher nos braços e subiu com ela ao olho da palmeira.
Lá esperou que a água
viesse e passasse.
A palmeira dava frutos
que os alimentavam.
A água veio, subiu e
cresceu.
O sol mergulhou e surgiu
uma, duas e três vezes.
A terra desapareceu.
A árvore desapareceu.
A montanha desapareceu.
A água tocou o céu e
Tupã mandou que parasse.
O sol olhou e só viu céu
e água.
E entre a água e o céu,
a palmeira.
A palmeira que boiava levando Tamandaré e sua companheira.
A corrente cavou a terra.
Cavando a terra, arrancou
a palmeira.
Arrancando a palmeira,
subiu com ela.
Subiu acima do vale,
acima da árvore, acima da montanha.
Todos morreram.
A água tocou o céu três
sóis com três noites.
Depois baixou.
Baixou até que descobriu
a terra e veio o dia.
Tamandaré viu que a palmeira estava plantada no meio da várzea.
Ouviram a avezinha do
céu, o guanumbi, que batia as asas.
Desceu com a sua
companheira, e povoou a terra".
Nenhum comentário:
Postar um comentário