sábado, 13 de março de 2021

a luz que abomino

 

Candles, Gerhard Richter, s/data


enquanto a luz (da vida) caminha

inexorável

à escuridão

prossigo minha busca

à poesia que esclarece…

e digo: não odeio

"a luz que começa a morrer

nesta noite serena”,

(oh, quanto desespero lírico, Dylan Thomas!)

antes, suspiro

meu pesar

e chego a chorar

todas as ausências que sofro

minuto a minuto

quando me entrego

por completo

aos raros momentos

em que me comovo

com um genuíno gesto de amor…


porque é disto que sentirei falta

se me lembrar!

durante toda a escuridão que me aguarda...


eis é a causa do sofrimento poético:

tal qual Dylan

considero a Morte injusta sim

mesmo sabendo que morrer é nossa condição

mas isto não esconde

o fato de que a Morte nos priva de tudo

que amamos

nos segrega do afeto, do gesto, do convívio

esta é a violência denunciada:

- o problema não é morrer

o problema é ficar sem o amor de quem amamos


nesse sim e não cósmico

compartilho com Dylan do mesmo horror

da mesma procura poética: luz!

não a evangélica

destruidora/construtora do mundo (interior/exterior)

segundo sua imagem e semelhança

habitada de infinita opressão

e corro para o lado de Ariano Suassuna

para compartilhar da sua simpatia pelos loucos:

porque eis que a loucura

nunca nos pediu um cordeiro no altar em holocausto

isto tem sido sempre tarefa da lucidez...

- a loucura tem nos levado

sim

a escapar da dualidade

da violência divina, violência de deuses dúbios

inseguros da própria divindade

esses tais que exigem sacrifícios

mas são absolutamente incapazes

de livrar da morte aqueles que amamos


eis a luz que também abomino


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