sábado, 7 de abril de 2018

o que fazer?



Dismantling the Red Tent, R.B.Kitaj, sem data


o que fazer, senhores,
diante do soberano arbítrio
e a timidez,
e a hesitação
e a insegurança da massa
em escolher um rumo próprio
a interdependência
e viver a delícia
a beleza e os riscos
de uma nova construção?

(e no entando
é preciso inventar provérbios
outras mitologias
novos enigmas
prodigiosos mistérios...
atenção:
qualquer cochilada
na leitura dessa
e de outras histórias
nos arrastará
de volta
àquele velho orfanato
àquele velho porão
esquecido da morte
onde até os vermes vicejam
à espreita
imersos na suposta obrigação
de manter o mundo limitado
àquelas quatro paredes
a alimentarem com carne humana
os cães raivosos
que lhes vigia o umbral)

o que fazer, senhores
diante do fim de tudo
e seus arautos
a esfregarem em nossos olhos
o medo espúrio da transigência e,
sob tutela imposta
baraço
pregação
diariamente
em horário nobre
nos declaram bastardos
e nos condenam a esse beco sem saída
até que, submetidos a essa vontade,
imploremos perdão ao irascível deus
antes que se dissolva
o último dos nossos torturados átomos?

o que fazer, senhores
quando tudo se resume a uma herança
manutenção de privilégios,
troca de favores, pecúnia
impossibilidade de fazer amigos
e influenciar pessoas?

o que esperar
senão a impossibilidade
de nossas mãos vazias?

então, confiemos
confiemos nas cantigas de roda
na arte
na dúvida
na curiosidade
e se verdugos abominam poesia
cantemos
cantemos às cinco da tarde
na contramão do inferno



Nenhum comentário:

Postar um comentário