sábado, 14 de outubro de 2017

delírio matinal 11º dia


Pintura em Espelho, Michelangelo Pistoletto, 1962



primeiro
me achas estranho
esquisito
diz não aos meus argumentos
e coisa e tal
depois, ao perceber que insisto,
me deprecias
transforma-me em coisa, monstro
e propagas a ideia
de que sou a imundície do mundo
o lixo da vida
a negação da história

mas, enfim
nada disso é sobre mim...
tudo é sobre você, não é mesmo?

… quando tiveres esgotado o verbo
e, irado, exibires baionetas
fuzis granadas obuzes
vírus doenças
gazes mortais...
quando incitares teus cães
tuas hordas
a limparem a terra
com as minhas entranhas
creio
que para o sangue
a coagular sobre as calçadas
mesmo que por um breve instante
olharás
e descobrirás, disforme,
que quebraste mais um espelho

e aí
(lamento que tenhas chegado a esse ponto)
aí não haverá mais a quem resistir
e será inútil chorar
o motivo de teres
sete sobre sete
esse aguilhão
a corromper teu olhar


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