sábado, 13 de agosto de 2016

Converxa


Conversation, Ossip Zadkine, 1955



E no entanto é preciso cantar
Mais que nunca é preciso cantar
É preciso cantar e alegrar a cidade
Vinicius de Moraes




- Ao nascermos não somos isso ou aquilo. Além da genética, da cultura, da psicologia, da educação, a identidade humana é formada, ao longo do tempo, por minúsculas escolhas que, combinadas, nos dão certa vantagem na batalha pela sobrevivência e que nos fazem ser isso ou aquilo… E estamos sempre mudando. 

- Mas enquanto juízes permanecem de cócoras, a exigirem privilégios, o trabalhador, puto da vida com o aumento da sua insignificância, chega em casa, bota os filhos no olho da rua, dá uma surra na mulher, comete suicídio e é exorcizado numa sessão de descarrego num templo das almas mortas. 

- Não confio que a história vai mudar. Não há indício disto. Na verdade, temo que as coisas fiquem cada vez piores.

- Meu caro senhor, o mundo está de olho em nós. Perplexo. Para uma nação que reivindica assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, surpreende a todos essa tentativa de transformar vício em virtude. Qual imagem queremos passar ao mundo? A de um país democrático, com uma Constituição respeitada ou a de uma falida e avacalhada republiqueta de quinta?

- Por mais que planejemos, o futuro será sempre uma incógnita. Todos os nossos esforços são para que ele não nos traga dissabores. Contudo, uma incerteza perdura: e se tudo der errado? E se aquela circunstância que não consideramos, predominar? Meu plano B é permitir que o instinto de sobrevivência, amparado pelo conjunto das minhas habilidades, atue em toda sua potência. E isto, para mim, é viver.

- A lucidez humana precisa intervir para evitar a conformação/deformação do nosso progresso pela minoria dominante.

- O mulato Santa Rosa foi fundador e diretor artístico d'Os Comediantes, grupo que renovou o teatro brasileiro, com a encenação da peça Vestido de Noiva, de autoria do Nelson Rodrigues, em 1943. Além de cenógrafo brilhante, era ilustrador, capista e pintor talentoso. Teve participação expressiva no Teatro Experimental do Negro, onde criou cenários para diversas encenações. Conta o mestre Darcy, em O Povo Brasileiro, que em conversa com um jovem aspirante à carreira diplomática, queixoso das imensas barreiras que dificultavam a ascensão social dos negros, Santa Rosa desabafou: – Compreendo perfeitamente o seu caso, meu caro. Eu também já fui negro.

- Agora que a bandidagem deixou cair a máscara; que não têm mais vergonha de serem chamados canalhas; que não há mais como esconder seus mal feitos; que sabem que o julgamento da história os condenará à desonra, que lhes resta? Cometer mais e mais arbitrariedades, todas… Como se não houvesse mais nenhum amanhã…

- Nos livros, o Brasil já existia muito antes da chegada da esquadra do Cabral. Descrita como A Terra Oriental, cortada por quatro rios imensuráveis, rica em ouro e pedras preciosas, de temperatura sempre amena, numa primavera eterna enfim, o Paraíso Terrestre. Os europeus que aqui chegaram trouxeram a profecia do Tempo do Fim, do Último Império, um reino que nunca será destruído.

- Vez por outra, velhos fantasmas me visitam. Diferente de velhos amigos me usam como bode expiatório… 

- Sei que uma bomba explodirá... Foda-se, apostei nisso.

- Posso até compreender que um individuo tenha apetite por merda. O que não posso aceitar é que tal hábito desagradável seja imposto como dieta universal… Comes terra?




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