sábado, 26 de novembro de 2011

Soltem a Magdala - Último capítulo


Comédia, Jacques Callot (1592-1635)


Derradeiro capítulo da saga ilustrativa do aforismo “Vão-se os dedos, ficam os anéis”, brilhantemente comentado na Introdução do célebre tratado de ontologia “Uma cebola é uma cebola, tudo o mais são favas” do admirável filosofo, colunista social e sacoleiro de profissão Athaíde Bossay de Melo Rego.

Falcão – Baterias antiaéreas daquele lado. Metrancas a cada vinte metros. Já acamparam na praça. Não permitam que subam a rampa.
Volupo – Falcão, vai dar uma voltinha, vai!
Falcão – Não captei!
Volupo – Sempre atrasado...!
Baleia – Excelência, mil perdões.
Volupo – Que foi desta vez, Baleia?
Baleia – Os ratos abandonam o navio.
Volupo – Respira.
Baleia – Os Prejudicados conseguiram o apoios dos credores.
Falcão – Ferrou geral.
Baleia – Ameaçam cortar o fornecimento de rabiolas.
Falcão – Ai, meus obuzes!
Volupo – Burocrário, traz a Magdala.
Falcão – Pirou?
Volupo – Fala pro povo, amor!
Magdala – (Toda fashion) “Erradicar a pobreza e a marginalização; reduzir as desigualdades sociais e regionais”.
Falcão – Boiei!
Volupo – Tem que ver as coisas pelo lado estético, sacou?
Falcão – Pra mim, isto é frescura.
Volupo – Acho melhor você tirar o seu time de campo.
Falcão – Mas o que foi que eu fiz?
Devassa – Não se engana muitos por longo tempo, Carcamano disse-me um dia.
Volupo – Aqui entre nós, me conta: você e ele...?
Devassa – Até parece...!
Volupo – Desta vez não pode haver engano, hein! Tudo terá que ser como manda o figurino.
Devassa – E quanto a Magdala?
Volupo – Viajará o mundo, alcançará a fama, aplaudida por todos.
Devassa – E se... você entende... ela entregar o ouro?
Volupo – Não se preocupe. Adicionei as três leis da robótica. Burocrácio, abra a rede.
Burocrário – Contagem regressiva!
Volupo – Aos seus lugares.
Burocrário – Em três, dois, um... no ar!
Volupo – Pelopinos e pelopinas. Não quero interromper por muito tempo a novela. Além do mais, o rango pode esfriar e aí a dona Maria vai ter que esquentar tudo de novo, coisa que o seu Zé não gosta, não é mesmo? E como não quero ser acusado de provocar dissensões no seio da sagrada família, vou direto ao ponto, odeio nhén nhén nhén! Venha até aqui, minha filha, chega mais. Estão vendo? Táqui do meu lado, minha sobrinha Magdala, a musa preferida do povão. Neste momento solene, eu, Volupo de Pelópia, decreto e assino aqui e agora, diante de todos vocês, a entrega, simbólica, do cetro e da coroa praquela que foi aclamada, por vocês, como a legítima soberana. Disse simbólica por que minha mui estimada menina ainda é menor de idade e só poderá sentar ao trono quando completar vinte e um aninhos, coisa que só acontecerá daqui a alguns anos. Naquela oportunidade faremos um plebiscito para sabermos se queremos a monarquia ou a república, não é uma boa? Enquanto isto, as portas do palácio estão escancaradas, apareçam prum cafezinho. Mas marquem hora, que isto aqui não é a casa de mãe joana. Portanto, congelem tudo que a antiga musa canta e preparem-se para o próximo campeonato mundial de arraias. Pelópia não perderá o bonde da história. Boooa noite!
Burocrário – Fecha a rede!
Volupo – Baleia, providencie um completo banho de loja na nossa menina. E ó: capriche na maquiagem. Quero fotos dela distribuídas em todos os jornais, repartições públicas, churrascarias e postos de gasolina... pra ontem, viu?!
Baleia – Vem, neném!
Volupo – E nada de intimidades, seu pervertido!
Magdala - “Caminhando e cantando e seguindo a canção”.
Volupo – Chiii, deu tilte na rebimboca da parafuzeta.
Burocrário – Bem que falei que aquela cartilha de OSPB estava com o prazo de validade vencida.
Volupo – Quero imediatamente uma campanha pelo estabelecimento da república.
Devassa – Espera aí, se você iniciar uma campanha para o estabelecimento da república e sabendo-se que a república caracteriza-se pela alternância no poder, o que me garante que iremos continuar no bem bom?
Volupo – Soltei a Magdala, não soltei?! Pensa que o povo esquece? Quando ela chegar à maioridade, teremos aprovada a república. E quem sairá candidato a presidente, quem?
Burocrácio – Gostei, mais uns vinte anos pra deitar e rolar.
Volupo – É ou não é um bom plano de previdência privada?
Baleia – Viva o presidente Volupo!
Volupo – Ai, cansei.
Baleia – Ainda tem os credores.
Volupo – Já falei: devo, não nego, pago quando puder.
Baleia – Mas eles querem um compromisso assinado e com firma reconhecida.
Volupo – Sabe a reserva do Catimbó Açu?
Baleia – Não me diga que...?
Volupo – Acabei de aprovar um projeto de preservação. Gringo adora um verde.
Baleia – Sensacional!
Volupo – Chega por hoje. Burô é com você, meu nego.
Burocrário – Acabei de receber estas belezuras de pipas.
Volupo – Mostra, mostra!
Burocrário – Os banqueiros mandaram como brinde.
Volupo – E todas têm títulos, que hermoso. Moô, qual preferes?
Devassa – Xavê: república nova, república novíssima, neo-república... ai, tô indecisa!
Volupo – Falcão, chega mais.
Falcão – Estou bem aqui.
Volupo – Acostume-se com os novos tempos, amigo!
Falcão – Saco!
Volupo – Vamos lá, quero ver todo mundo empinando papagaios!

Cai o pano.


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