quinta-feira, 4 de março de 2010

Fazendo Pesquisa

- Ligue para cada um dessa listagem e peça três ou quatro endereços de clientes que tenham adquirido o produto nos últimos três meses.

Evangélico, batizado, jurado e sacramentado.

- Mas isso... os vendedores não vão entregar o “ouro”, ainda mais para a concorrência!

Uma multinacional fabricante de PABX's queria investigar os processos comerciais dos competidores.

- Inventa uma desculpa! Diz que estamos querendo comprar o equipamento e, como tivemos problemas no passado, queremos fazer algumas consultas sobre o processo de comercialização e instalação.

- Rapaz, sei não...

- Na guerra e no amor, vale tudo, meu caro.

- Sabe... li certa vez: “Ó meu bom Pai, livrai-me do convívio maligno com a mentira e todas as formas de mistificação”.

- É, mentir é coisa do diabo. Porém, se você conhece a Bíblia, vai encontar no Eclesiastes: “Não sejas demasiadamente justo nem demasiadamente sábio, porque te destruirias a ti mesmo”. É pagar ou largar. Precisamos de uns trezentos nomes. Para cada um que resulte em informações relevantes para o nosso cliente você ganha cenzinho.

Pragmático, o meu religioso, não? Tal qual o casuísto jeitoso e esperto que fuça, fuça e sempre acaba encontrando uma brecha jurídica que favoreça sua causa, tudo em nome da perservação da banca.

No dia seguinte, arregaçei as mangas e botei a mão na massa, afinal a perspectiva da grana era boa porém, avec une puce à l'oreille, não me largava aquela sensação de que estava abeirando-me do cinismo, o fim justificando os meios ou vice versa ou versa e vice, sei lá... Resultado: o negócio gorou porque ninguém consegue enganar a todos por tanto tempo. Uma empresa pesquisada decidiu mandar um consultor fazer-nos uma visita. A moça se apresentou com uma proposta debaixo do braço e pronta para ser ouvida. Ninguém teve coragem para recebê-la. Jogaram para cima de mim, claro, afinal eu que estava na linha de frente, que fora quem realizara o contato e coisa e tal e que, provisória e momentâneamente, encontrava-me promovido a gerente sei-lá-das-quantas e que tratasse de dar um jeito rapidinho naquele inesperado inconveniente. Acomodaram a moça na sala de reuniões, com cafézinho, água, chá e bolachinhas e avisaram que eu, o doutor fulano, estava vindo. Entrei na sala com ares de quem anda com a cabeça a mil. Enquanto passava os olhos pelos prospectos e examinava as especificações com o maior cuidado e interesse possíveis, tive a atender dois telefonemas dos meus colegas tirando sarro com a minha cara de sério, exigente e atarefado laranja. Após dez minutos de presepada, recostei-me fanfarronamente na poltrona e cuidei de despachar a vendedora com um pragmático, curto, gosso e sonoro “Vou ser sincero com a senhora, sua proposta é muito boa e vantajosa mas, sinto muito... se tivesse aparecido aqui um dia antes... Acabei de aprovar a proposta da empresa X. Mas deixa comigo o teu material que qualquer coisa a gente liga... Passar bem e obrigado”.

O que a gente não faz por alguns trocados! Justiça, verdade, quem se importa? O importante é seguir um manual onde seja possível encontrar justificativa para tudo e que, principalmente, nunca te deixe a mercê da consciência. Esta sim, dificil de ser enganada. Depois, é só elevar aos mãos aos céus e clamar: Ó Senhor, perdoa, preciso sobreviver!

Que viva o finado Machado e a sua insuperável Teoria do Medalhão, verdadeira obra prima, prenunciadora sagaz da onda cretino-arrogante-e-pia que nos assola.


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