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sábado, 13 de setembro de 2025

a dor poética

 

O Idoso Triste, Vicent Van Gogh, 1890


sou Bukowski e

sou Drummond

defendo a mesma ideia

bêbado ou sóbrio:

a poesia é incurável

 

o poeta é uma dor

que luta para entender

aquilo que não cessa

e consome -

o fogo que arde

e por fim queima

 

o poeta

embora trave seu combate,

busque exorcizar sua dor -

em combustão se esgota:

A derrota é inevitável,

mas a batalha

é a razão

do ser

poético


 



sábado, 30 de agosto de 2025

combate a violência

 

As Sete Musas, Google Gemini



nossos antepassados,

para combater a violência

inventaram a arte

escultura

pintura

poesia

música

história

teatro

dança

sete musas a nos inspirar

no combate à crueldade


nos tempos modernos

para descarregar

a alma do absurdo

inventamos

o cinema e

o desenho animado


mas a discórdia

continua a nos dizer,

sem qualquer gentileza,

que a realidade

é dura e fria:

não há como vencer a força bruta!


me vem à lembrança partisans

maquis, vietcongs…


nada é tão imenso

que, de tão imenso,

um dia não venha ao chão


 

sábado, 23 de agosto de 2025

vingança

 

Filho Pródigo, Gustavo Doré, Séc XIX



o pai traz o filho

abandonado

em seus braços


enfrentaram monstros

pai e filho, sem concluir

que o combate é prova de vida


traz hoje, o pai

em seus braços,

o filho ferido, raivoso

garras exibidas,

herdadas


o filho quer sumir o pai

mas assalta-lhe

alguma compaixão

não pelo pai, mas por si


o filho se salva

ao revelar humanidade

e salva o pai

que vê consumada

sua vingança




sábado, 16 de agosto de 2025

as mil máscaras do doutor nein

 


Imagem criada no Google Gemini


outro dia topei

com um sujeito vestido de cadáver

a brandir um ensebado livro

e cuspir uma singela revelação


antes que conseguisse me desvencilhar

vociferou a sufocar meu pulso:

branco é a única cor

e tu és um demônio, pobre

a patinar no sangue seco das calçadas,

culpado da tua própria exclusão – escuta!


O dedo em sentença,

escolheu uma página aleatória

no livro escudo

e agrediu meus sentidos

com uma receita da prosperidade:

imite o patrão –

esse sol que arde mas não queima!


renegue o perseguido, desafiou:

o mal que te habita em negação

tu, anticidadão do bem,

prisioneiro de meia dúzia de baderneiros,

em terra arrasada vivente,

tu, índio, preguiçoso, preto

nordestino, baiano, paraíba

analfabeto, cachaceiro,

bucho de cuscuz, bucha de canhão… lembrai!

foste abençoado pelo dono da liberdade,

o divino criador de tudo e todos,

sabedor de toda agulha no palheiro

conhecedor de toda desilusão… ele

tem um módico plano para ti:

todos os privilégios do mundo

além da salvação eterna

se obedeceres… oh, glória, aleluia…

amém?


ameacei chamar a polícia

ele riu

e apontou para a câmera

pendurada no peito

e para o distintivo dourado

estufado na lapela do seu surrado uniforme...



 

 

sábado, 9 de agosto de 2025

geografia da memória

 

Mapa, Gretchen Andrew, 2021



a cidade era o mapa

que coube

na cabeça do menino…


avenidas, praças

ruas, vielas, becos,

ermos e fronteiras

o menino desenhou…


com retas e curvas

construiu o universo

dos 10 anos que fazia

e o menino riu…


mas ao ver a cidade

triste

vazia

pesou-lhe

os afetos que sentia…


num gesto de rebeldia

virou o mapa

de ponta cabeça…


imediato

o traçado da cidade

em seus contornos

assumiu

todos os rostos

que o menino conhecia


 

sábado, 12 de julho de 2025

ser humano

 

Homem vitruviano, Leonardo da Vinci, 1492


unidade orgânica sensível

traços característicos

limitada no tempo e no espaço


capaz de nomear-se

e nomear o mundo


origem comum

sucessão infinita de relações

singular na história


capaz de sonhar

de pensar sobre si

e nas coisas exteriores


produtor, reprodutor

capaz de evoluir

tocar o sublime

e ainda tatear

no abismo ancestral


toda honra

às crianças e aos loucos

e, principalmente,

aos que nada têm a perder

além da dignidade


 

sábado, 5 de julho de 2025

o sorriso e a dor

 

Imagem gerada pelo Gemini


sorriso nascido

no canto da boca,

incrustado -

quem lhe cuspiu

no rosto tal estigma?


será feliz, meu menino?

disse a mãe para quem sorrir

era espantar o mal

vai, filho, salva o mundo!


e a criança vida afora riu disso

com um desajeitado sorriso

e não lhe sumiu o riso

apesar de toda espera

 

sem ninguém perceber

doeu-lhe o riso

tornou-se banal

e a máscara amarga

tomada de audácia

gerou a risada fatal


 

sábado, 21 de junho de 2025

subjetividade

 

Tales from the Loop, Simon Stålenhag, 2014


até onde sei (e vejo)

pessoas gostam de flores

plásticas…

tum-tum – ocupado!


ah, sonhei em ser origami

emoji dobrado ou hashtag…

tum-tum – sinal perdido,

poesia não encontrada!


(carregando 54%)

diante do erro 404

dissimulo ou me espelho

num botão de like?


último comando

executar #autodestruição:

desapareço ou me cancelo?


tum-tum erro 418:

sem dispositivo pra ser exibido

subjetividade desinstalada com sucesso

 

este poema se autodestruirá em 5 segundos!


 

sábado, 14 de junho de 2025

filho bastardo de cowboy hollywoodiano

 

Imagem gerada pelo Google Gemini


descendente de bandeirantes

capitães do mato, milicos, jagunços

milicianos high-techs, políticos de bolso

(com um livro de phantasmagorias

debaixo do braço)

crentes pragmáticos na divindade,

na pátria e na liberdade de expressar

que todo dia é dia de branco

e na festa no ap

vai ter sofrência pop e petiscos

servidos em baixelas de prata

do que sobrou do lombo dos negros

índios, pobres e periféricos


traficantes da fé alheia, coaches e influencers,

a soldo de casas de apostas aliciam

nubentes veteranas movidas a botox

para acasalarem com bons meninos de chicago

e conceberem in vitro

mais uma receita para estufar o bolo


incensados por animadores de auditório

nas tardes entorpecidas de domingo

um terço da população, inflada de patriotismo,

bate continência à entidade que empreende

mais um inferno ultramoderno

importado do vale do cilício

criado sob medida para os outros


ai de mim,

ai de ti,

ai de nós!


 

sábado, 24 de maio de 2025

e se eu não lembrar

 

O grito, Edvard Munch, 1893



e se eu não lembrar...

 

a luz apagar

o alarme calar

o telefone esquecer

a porta trancar

a comida faltar

e tu apagar


a insônia bater

o sol desviver

e eu sucumbir

e estragar

lastimar

lacrimejar

e tu nem aí


e se eu gritar

e tu desistir


e eu jogar

pra fora daí


e o meu eco

derreter o ar


e nem o vazio

me reconhecer?



sábado, 17 de maio de 2025

experimento

 


Alice in Wonderland, René Magritte, 1945



desdobro -

jamais inteiro

sempre fração


qualquer lado

me opõe

a mim mesmo


viajo

na perspectiva de alcançar

a face do meu disfarce


sou uma alma

mutante

idosa e estranha


 

sábado, 3 de maio de 2025

pensamentos de última hora

 

Não deve ser reproduzido, René Magritte, 1937


imaginar deus é a nossa fortuna eterna,

mas dar-lhe existência

torna miserável a nossa.


só existe sentido na incompletude

na carência, na ausência

na saudade do mundo…


sou tudo aquilo que me falta

ainda mais

aquilo que jamais alcançarei…


transitório,

quanto mais me encontro

mais me perco…

 

me escondo no reflexo

da minha própria natureza


 

sábado, 19 de abril de 2025

saga de um gozo

 

Caritas Romana, George Pencz, 1538



Noemi

mesmo sem tempo,

(tinha que chegar na hora no trabalho)

todo dia, esbaforida

dava uma geral na casa

pensando numa possível noitada

com aquele colega de departamento

aquele tal do peitoral sexy

e promessa gostosa

de um prazer para além de todo sexo…

mas o que ela não pensava

é que não adianta

deixar a casa um brinco

se o mundo continua lixo


Noemi

de quantos e tais detalhes

cansada, acenava ao coletivo

e lá ia, encoxada, bolinada,

indiferente a tudo (menos ao nojo

e ao colega de departamento

a lhe atazanar os sentidos…)


no dia que encontrou coragem

o convidou para um café

mas ele a empurrou contra o portão

suspirou “ahhhh…”, a sufocar seu silêncio

num gozo alheio e

com a calça encharcada de gala,

se mandou pela rua afora

sem nem ao menos perguntar:

foi bom pra ti?”


Noemi

ao devolver um dos seios para dentro da blusa

ergueu os olhos para o céu estrelado

ao tempo em que sentiu os pés

sobre o indiferente asfalto,

sussurrou para o vazio,

como se estivesse diante de um espelho estilhaçado:

quem, diabos, inventou o sexo?


 

sábado, 5 de abril de 2025

entre o agora e o nunca

 

Músico, Thiago Boecan, 2018



no blue desse tédio

abacaxi de caroço

rosna um carro dentado

a flutuar na rua de ninguém

(petróleo, fuligem

óleos, passos metálicos

e cobras elétricas enroscadas em postes…)

à margem, coqueiros

suspiram folhas

e frutos vadios

tal qual

uma sacola vazia

de supermercado

tangida

o olhar amarelo

do semáforo pisca vigilante

entre o agora e o nunca

uma moeda de sangue

é cuspida na face inútil

duma rosa de plástico

plantada sobre a geladeira

um espelho estala na sala

meu coração improvisado

exala arpejos

a tatear canções 

 


sábado, 29 de março de 2025

canção em meio ao caos

Colagem, Mister Blick, sem data


dizem por aí

em prosa e verso

após uma batalha de amor

o guerreiro vigorado

torna à guerra renomado

com redobrado ardor


eu, logo amáramos

desejo apenas dormir

no sonho fruir da poesia

(uma quadrinha que seja)

abraçar a eternidade

versejar em meio ao caos


dona, graça tal me cedes

por este amor, me enlaça

pois se me caça a guerra

apresso o verso opresso

faço da alegria bandeira 

da nossa cama trincheira


 

sábado, 8 de março de 2025

hoje

 

O que torna as casas de hoje tão diferentes, Richard Hamilton, 1992



hoje, ah hoje…

nem bem acordo o celular dispara

a promoção do dia, o desastre

a falcatrua, a mentira

o imbróglio político, o escândalo

o joguinho que interrompi ontem…

frequência cardíaca a mil,

glicose no teto, bolsa cai…

funerária boa viagem fez uma ligação perdida, ah!

antes que’u esquente ovos pro desjejum

a ia me avisa da teleconsulta

para implorar cardio que

avalie o risco cirúrgico

de uma inevitável remoção de catarata…

em meio a tal burocracia me assalta um pensamento:

pobre burro num corre insano

através de florestas em chamas, terremotos

tartarugas engasgadas com canudinhos de plástico

tô nem aí e améns

a fugir de tigres e tubarões famintos mas

ainda vivo e a ver o burro, zurro e açoito:

no dia derradeiro finda o poema,

a não ser que alguém decida repetir

ou dar continuidade ao verso


 

sábado, 1 de março de 2025

o colonialista

 

Colonização da América, Carlos Latuff, 2008


ontem entrei na vossa terra

fugido de outros fortes

que minhas ideias perseguiam…


e, agora, perseguido por vocês

galopo furtivo nesta terra

que ainda não é minha mas

pela graça da divina promessa

me foi destinado este chão

o chão que ocupais, para nele edificar

um reino digno da excelsa glória


porque me perseguem então, ímpios -

não ouviram o chamado que o deus fez a mim?


dele trago o dever de aniquilar todos vocês

mas por minha sapiência e benevolência

poupo os frágeis – mulheres, velhos e crianças,

os confino em terras fracas para que não prosperem

e não alimentem a vingança dos ancestrais


mas, vocês ainda me perseguem

não mais bravos guerreiros

mas fantasmas, assombrações

miríades de choros, lamentos, gritos

agonia que ecoa a calada dor

à custa das armas, doenças, drogas e dinheiro