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sábado, 12 de abril de 2025

medo

 

Medusa, Caravaggio, 1587


no começo era o medo…

na sua escuridão pegajosa

um lume brota do desespero, mas

companheiro o medo se insinua

nos meus poros e sentidos

a oferecer fundamento

à minha angústia

aos meus temores

à minha fraqueza


no começo era o medo…

sou eu – o próprio

a sussurrar comigo

uma aflição em brasa

na irracional veneziana

a atiçar o vento

a estalar a casa

a eriçar os pelos


no começo era o medo…

e eu, a presa que cede

antes que enlouqueça, durmo…

vez ou outra -

do medo, explode alguma alegria

um fruto ruidoso

que o próprio medo não cala.


 

sábado, 12 de novembro de 2022

a lenda do ramo de ouro

 

Festival de Corpus Christi, Francisco Goya, 1813




ó acúmulo de fantasias,

práticas mágicas e religiosas,

superstições, ritos e sacrifícios…

preciso controlar o incontrolável,

o rio tumultuoso das manifestações d’alma


ó festins diabólicos, imolações humanas,

progressão sangrenta, condutas rudes e perversas

rituais antropofágicos: quero a comunhão heroica

o simbolismo, profecias modernas

evitar a catástrofe final… alcançar o sublime


ah, minha humanidade

sigo vítima da tua fecundidade:

quanto mais me multiplico

instantâneo me torno irrelevante,


inútil, me grudo à bichalidade

onde as pulsões buscam me fazer esquecer

tudo que de fato importa…

e eis que a revolução

alegre, desde as cinco da tarde

passa ao largo em desfile no rumo oposto

ao sentido do trem que insisto em embarcar



sábado, 30 de abril de 2022

pétalas e plumas

 

The Spring, Walter Crane, 1883




Sim! Sou um poeta e sobre minha tumba
Donzelas hão de espalhar pétalas de rosas”

Ezra Pound, E Assim em Nínive





sou poeta,

bebo vinho,

saúdo a vida

e clamo a ti, fulana:

quando eu morrer

espalhe pétalas e plumas sobre a terra

para aqueles que ainda caminham

pisem suave

sobre o efêmero lar


 

sábado, 6 de fevereiro de 2021

ode à tristeza

 

The Captive Slave, John Simpson, 1827




Tire seu sorriso do caminho

que quero passar com minha dor”

Nelson Cavaquinho, A Flor e o Espinho




ouça, amiga, a poesia é triste…

justifica, atenua 

legitima a dor... 

sente a causa

quem sente a tristeza do mundo


evoco Rubens Alves e sua epifania

(no conto “ensinando a tristeza”,

inspirado no Eclesiastes 7:3 e,

principalmente, pela observação

que lhe faz uma neta entendida de compaixão):

aquele alegrinho

que está o tempo todo esbanjando alegria

dizendo e querendo ouvir

coisas engraçadinhas

é um flagelo… perto deste

perdemos a liberdade de ser triste”


pois é, o alegrinho é um aleijão empático,

solidário apenas consigo mesmo...


desconhecido da compaixão,

resta a este alienado narciso

reivindicar

        atrevido e irresponsável,

que a sua alegria nos seja a prova dos nove:

        ilegítima pretensão.


é que faltou-lhe perceber que a alegria

não brota da vontade

de um movimento individual da vontade…


- a alegria, poetas

é filha dileta da dor!