outro dia topei
com um sujeito vestido de cadáver
a brandir um ensebado livro
e cuspir uma singela revelação
antes que conseguisse me desvencilhar
vociferou a sufocar meu pulso:
branco é a única cor
e tu és um demônio, pobre
a patinar no sangue seco das calçadas,
culpado da tua própria exclusão – escuta!
O dedo em sentença,
escolheu uma página aleatória
no livro escudo
e agrediu meus sentidos
com uma receita da prosperidade:
imite o patrão –
esse sol que arde mas não queima!
renegue o perseguido, desafiou:
– o mal que te habita em negação
tu, anticidadão do bem,
prisioneiro de meia dúzia de baderneiros,
em terra arrasada vivente,
tu, índio, preguiçoso, preto
nordestino, baiano, paraíba
analfabeto, cachaceiro,
bucho de cuscuz, bucha de canhão… lembrai!
foste abençoado pelo dono da liberdade,
o divino criador de tudo e todos,
sabedor de toda agulha no palheiro
conhecedor de toda desilusão… ele
tem um módico plano para ti:
todos os privilégios do mundo
além da salvação eterna
se obedeceres… oh, glória, aleluia…
amém?
ameacei chamar a polícia
ele riu
e apontou para a câmera
pendurada no peito
e para o distintivo dourado
estufado na lapela do seu surrado uniforme...
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