sábado, 27 de janeiro de 2018

fechem todas as escolas


A Ditadura Togada, Vitor Teixeira, 2016





fechem todas as escolas
dois e dois não somam quatro
e o caminho mais curto entre dois pontos
é uma encenação processual kafkiana
onde um juízo baseado no arbítrio
projeta um labirinto pra esconder o bacanal

fechem todas as escolas
esqueçam os argumentos
cessem com os debates
queimem todos os códigos
sumam com todos os tratados
simplesmente porque gosto não se discute
e a declaração individual, baseada em mera impressão
anula por completo a doce e dura realidade

fechem todas as escolas
porque agora estar na posição de mando
passa a ser prova irrefutável
da infalibilidade do agente
desde hoje, as partes dirigir-se-ão ao mercado
(único amalgama válido e permitido)
em busca da própria justificação
demonstrado está que o mérito
e os tradicionais laços de ternura e herança
permanecem os únicos e legítimos princípios
espirituais na vida de qualquer um
e a prova inconteste da superioridade moral
daquela meia dúzia de presidentes
dos conselhos administrativos
de impolutas e virtuosas corporações transnacionais

fechem todas as escolas
        nasceu o “cala a boca, professor:
porque devo confiar no senhor,
quem lhe deu autoridade?
pensa bem,
ganhas bem menos
que o meu tio que é oficial
de justiça
e que conhece todo mundo
nos escalões superiores
diga-me agora, professor,
numa disputa de conhecimento
quem sabe, quem pode mais”?

fechem todas as escolas
que o alienista finalmente chegou
e explicou o raciocínio: as leis
(esse amontoado de letras mortas)
por não acompanharem a dinâmica
das mudanças sociais, foram substituídas
pela lei da conveniência daquele que julga -
regra por demais eficiente e sensível
às oscilações cambiais do rentismo da vovó

fechem todas as escolas
dado por encerradas todas as histórias
não há mais necessidade de novas narrativas
principalmente, para que jamais se diga
que foram abertas as portas do inferno - 
embora não tenha sido comprovado
pelos redatores das novelas das nove;
e mesmo que seja conhecida a desfaçatez 
inominável da editoria nacional;
do rompimento total com a racionalidade
dos agentes públicos responsáveis pela garantia
do exercício da cidadania;
jamais será permitido dizer, ou melhor
jamais será verídico
que a novíssima ordem mundial
dividiu o mundo em colônias
(ou capitanias - a nomenclatura pouco importa)
baseados em súmulas e acórdãos
redigidos nos ilustres salões
inatingíveis e mágicos
do Bank Central

fechem todas as escolas


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