Narciso, Caravaggio, 1599
aquele
desejo impossível
que
insiste em me ocupar
aquele
pensamento infantil
aquela
esperança de que a mágica
possa
acontecer
e
sem qualquer esforço
consiga
eu alterar o rumo do poema
é
o que me mantém distanciado e
a
salvo do mundo
porque
o possível
é
passível de muitos e inúteis sacrifícios
só
o verdadeiramente forte
arrisca
ousar
diante
do perigo
diuturno
apenas
para rir
durante
um magro instante
antes
que lhe repreenda
as
regras do jogo incessante
porque
é preciso ultrapassar
a
mão invisível que tolhe
a
voz
porque
é preciso afinar o canto
e
entoar a canção
que
orienta
a
corrida de obstáculos
-
trajeto previsível -
que
justifica a massa de invisíveis
desassociados
que
lotam as estações
todo
dia
nessa
hora
qualquer
um ostenta a minha cara
e
permanecemos uns nos outros
como
duplicados decalques
temerosos
que a mais leve brisa
nos
desfigure
nos
falsifique
nos
deturpe
nos
adultere
nos
desnature
e
não tenhamos tempo
para
aprimorar a técnica de
depilação definitiva
e
tracemos tatuagens
-
símbolos inequívocos -
em
nossos dorsos
que
nos repugne
de
toda e qualquer
maldade
mas
aí penso ser tarde demais
todos
os deuses já partiram
restou
apenas eu
e
essa
vontade
inadequada
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