sábado, 17 de maio de 2014

Nicolau, o Democrata



Paixão, Frank Dicksee, 1892



A vida tinha que ser mansa, livre de encrencas. Com os da sua qualidade, fácil: três palavrões e pronto. Mas com as mulheres… com as mulheres, não há estratégia. Tudo é improviso.

Neste quesito, desde cedo, deu o jogo por perdido. Filósofo, arquitetou uma saída honrosa. Afinal, perdedores também possuem dignidade. Porém, quanto deste tiquinho pode ser resgatado no final? O segredo é evitar movimento em falso, sentenciou. Nada de carregar a pecha de machista ou, deus o livre, de canalha. Mas vejam só: tinha que manter a palavra final e rezar por um argumento milagroso. Enquanto isto, o jeito é jogar as palavras e só emitir juízo quando tiver certeza.

Certeza de que, Nicolau? Quis saber Dagô, companheiro de todas as horas - principalmente as incertas.

Sei lá, pode ser que um dia alguém as decifre.

Sabe qual é o seu problema? Você só se mete com chave de cadeia. Porque não procura alguém cabeça, inteligente, de conteúdo?

Assim você está querendo ver a minha caveira. Esqueceste do Pinduca? Aquela professorinha, mais neurótica que heroína de Woody Allen, levou o pobre à loucura e depois disse, na maior cara dura, que era só sexo. Isto não se faz. Homem tem sentimentos.

Mas ele aprendeu, não aprendeu? Tem hora que é preciso um choque de gestão.

Choque de gestão é o cacete. O que ela fez foi cuspir no prato que comeu. Onde já se viu, desprezar um pobre daquele jeito depois de tudo que ele deu e ainda fazer comparação.


Apesar do tormento, ancorava-se na impressão de que quase nada se sustenta diante do velho e corriqueiro bom senso e, para não passar por bunda mole, tinha sempre à mão um sim, desculpa amor e o infalível você tem toda razão querida bem enérgico e altivo. Acontece que Marilda era o diabo em pessoa. Corpo de deusa, desejos incomensuráveis e uma boca dos confins de todos os infernos. Por que cargas d’água meteu-se naquele imbróglio? Se os deuses não sabiam, que dirá Nicolau. Porém, ele é o cara. Chegado a extravagancias. Sempre imbuído das melhores e potentes intenções, certo de que é possível viver feliz, para sempre, com o seu oposto. Quem sou eu pra caçoar da crença dos outros. 


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