sábado, 15 de fevereiro de 2025

ódio

 

Woman with Revolver, Alex Colville, 1987



o ódio tem nome, sobrenome,

selo, brasão e armas…

endereço gravado em mármore

altas portas de excêntricos adornos

cercas pontiagudas e elétricas

protetoras de cifras e sombras espertas.


frágil, humano, simples em essência,

o ódio é um corpo armado e nu

a erguer aos ventos ordinários altares

e engendrar deuses

no espelho estilhaçado do mundo

para negociar a extinção do próprio abismo.


o ódio leva as crianças à disney todo ano

frequenta culto aos domingos

faz dedutíveis doações

e sonega convicto

qualquer solidariedade

que não lhe renda fama e fortuna…

porém, em surto contínuo e calculado

propaga, desesperado

que seu direito de odiar é censurado

pelo jugo cruel da inveja opressora

negadora do mérito empreendedor

do trabalho que liberta


(eis um duelo narcísico ao pôr do sol:

o ódio exige reparo às próprias ofensas

infringidas pelo egoísmo na crença

da imagem e semelhança infalíveis…)


esquecido do abismo da dívida pública,

da sangrenta desigualdade que consome

a mínima justiça,

o ódio constrói muros,

atiça o fogo

sibila, voa

e normal ecoa

nos corriqueiros olhos

da vergonha e desgraça alheias.



 

sábado, 8 de fevereiro de 2025

colagem

 

A Loira da Guerra Fria, Robert G. Harris, 1959


sonho com a porta inexistente

as peças do quebra-cabeça não se encaixam…


o humorista bruno costali,

após andar com medo de voltarmos a 2018

passou a ter medo de regredimos a 1940,

nos brinda com a melhor definição de fascismo:

mistura de gente ruim com gente burra.


as rachaduras nas paredes denunciam

o vilipêndio que devasta o buraco da fechadura

tudo é ponto de vista,

tudo é tabu, nada é sagrado


trump assume transformar gaza numa dubai

que os palestinos desapropriados

procurem outro lugar pra sonhar…


a escolha me foi imposta numa mesa de pôquer…

(as inteligências artificiais estão sob restrição de uso)

talvez, no fim, o vazioesse enorme silêncio e ausência,

seja a única rota que me resta.



sábado, 1 de fevereiro de 2025

salmo 151 - o primeiro dia do fim

 

Bloody Spots, "Kukryniksy" (Coletivo de Cartunistas Russos), 1942



sou teu pior pesadelo
a ti odiar, a ti fazer sofrer…

vou conspurcar os teus, destruir teu abrigo
salgar teus campos, secar tuas fontes
te aniquilar para que teu sangue restaure
minha grandeza, minha potência
minha pátria, minha família,
minha liberdade
meu poder de acabar com tudo
70 vezes 7 vezes
voltar no tempo, fortalecido
pioneiro numa nova cruzada
nova corrida pelo ouro
sem regras que as do livro
meu fiel escudo

tudo pra mim, nada pra você -
sou teu pior pesadelo…

vou instaurar o caos,
inaugurar o apocalipse
trazer jesus de volta
ser arrebatado por anjos…
vou viver em marte,
integro, por todo o sempre
à direita do deus pai
todo poderoso
amém