sexta-feira, 8 de março de 2024

em dia de mulher

 

A Mulher, o Homem e a Serpente, Byam Shaw, 1914


esse negócio de dizer

que mulher é uma incógnita

é papo de quem não sabe

ou não quer

agradá-la…


o orgasmo feminino

tem sido lugar de fala das lésbicas

(alegam saber fazer uma mulher “chorar”

no mínimo, umas dez vezes

numa única vez)… mas


existem homens capazes

de entendê-las e amá-las

senão o Kama Sutra

será uma obra de perversão

e não um tratado de sabedoria


a mulher nunca foi mistério

prá seu ninguém

sempre esteve aí, à flor da pele

de quem articular

um singelo

descansa tua cabecinha no meu ombro e chora”

diante da dúvida, do medo

da incerteza, da desconfiança, das cólicas…


senta pra ouvir o diário sangramento

mesmo quando não sangra, porque

a mulher sangra, caríssimo!

e quando não sangra está servindo de morada...

 

e não me venham dizer

que a mulher não tem o direito de expulsar

o indesejável ou a raiz de uma invasão agressiva…


daí quando a mulher

maternalmente

nos aplica uma rasteira

um safanão

um pescoção

uma palmada pela malcriação

choremos sem vergonha

na volta por cima

porque sem a mulher

nós, machos, cabras de peia

faríamos parte

do planetário bando de bobões,

coletivo de ninguéns

zé-manés atoa, babões sem eira nem beira

a implorar por aquele cheirinho gostoso

que nos atiça o desejo de vestir suas calcinhas


 

sábado, 2 de março de 2024

Homens da minha vida

 

Estudo do Homem, Anita Malfatti, 1915


Minha primeira paixão? Pateta (o amigo do Mickey). Depois vieram Cavaleiro Negro, Zorro, Jerry Lewis, Elvis Presley… Cinema e Quadrinhos, quadrinhos e cinema… paixões cultivadas até…

Um dia li um livro do Monteiro Lobato (não lembro o título), e uma passagem me chamou atenção: um aparelho nos fazia viajar à pré história da humanidade. Explodiu minha cabeça… Mal sabia que adiante conheceria a televisão.

Me apaixonei pelo meu professor de português (na época do ginásio), que me disse o porquê participar de passeatas e mais adiante o encontrei no Robin Williams da Sociedade dos Poetas Mortos.

Clint Eastwood foi o durão mais amável que passou pela minha vida (muito mais depois de Os Imperdoáveis). Também me cativaram, pelo charme e doçura da masculinidade, Marcello Mastroianni, Marlon Brando, Al Pacino, Robert De Niro…

(Porque será que nunca me apaixonei pelo Superman, Batman ou qualquer outro super-herói?)

Ah, Junito Brandão… professor de literatura grega… sua escrita me fez comprar a coleção inteira dos seus livros e me deliciei com suas histórias assombrosamente vibrantes de deuses e semideuses mitológicos.

Um professor num colégio cristão destinado a formar boas esposas, Joseph Campbell, me desvendou As Máscaras de Deus e percebi a mecânica que movimenta esta criação ardilosamente humana.

E Isaac Asimov? Ah, este me fez entender, com A Última Pergunta, que amar é sobretudo conhecer.

Borges e suas Ficções foi amor à primeira linha; As Cidades Invisíveis fizeram tanto carinho na minha alma que ainda hoje penso em sair de porta em porta a perguntar se têm um instante para ouvirem a palavra do Ítalo Calvino.

Reservo um cantinho secreto do meu ser exclusivo para o Pessoa, quase um heterônimo de mim mesmo.

Por obrigação, li Vidas Secas, São Bernardo… E me foi impossível não ceder à paixão diante de Graciliano Ramos que, num passe de mágica, me levou aos braços de Machado de Assis, onde me aninho, certo de estar, senão na melhor companhia, mas na presença de alguém que, nos tempos atuais, em meio a tantos implacáveis fuderosos fodásticos, nos apresenta a vida real - a verdadeira, bela e contraditória experiência humana. 

 

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Síndrome de Bentinho

 

Atrás da cabeça, Argishti Mesropyan, 2019


Moribundo, agarrado na mão do filho, não consegue evitar o pensamento que o persegue desde sempre: “fruto meu, resultado da minha união com uma infiel dissimulada de olhos oblíquos, tu és gay, pois não?!”

E mirou a filha: “Quanto a ti, minha filha, flagrada em indecências com outra garota… bem, talvez venha a me dar alguma alegria… menina arretada, sim senhor.

E acordou no 8º círculo do inferno dantesco. "Era gay, não tenho dúvida".