sábado, 12 de abril de 2025

medo

 

Medusa, Caravaggio, 1587


no começo era o medo…

na sua escuridão pegajosa

um lume brota do desespero, mas

companheiro o medo se insinua

nos meus poros e sentidos

a oferecer fundamento

à minha angústia

aos meus temores

à minha fraqueza


no começo era o medo…

sou eu – o próprio

a sussurrar comigo

uma aflição em brasa

na irracional veneziana

a atiçar o vento

a estalar a casa

a eriçar os pelos


no começo era o medo…

e eu, a presa que cede

antes que enlouqueça, durmo…

vez ou outra -

do medo, explode alguma alegria

um fruto ruidoso

que o próprio medo não cala.


 

sábado, 5 de abril de 2025

entre o agora e o nunca

 

Músico, Thiago Boecan, 2018



no blue desse tédio

abacaxi de caroço

rosna um carro dentado

a flutuar na rua de ninguém

(petróleo, fuligem

óleos, passos metálicos

e cobras elétricas enroscadas em postes…)

à margem, coqueiros

suspiram folhas

e frutos vadios

tal qual

uma sacola vazia

de supermercado

tangida

o olhar amarelo

do semáforo pisca vigilante

entre o agora e o nunca

uma moeda de sangue

é cuspida na face inútil

duma rosa de plástico

plantada sobre a geladeira

um espelho estala na sala

meu coração improvisado

exala arpejos

a tatear canções 

 


sábado, 29 de março de 2025

canção em meio ao caos

Colagem, Mister Blick, sem data


dizem por aí

em prosa e verso

após uma batalha de amor

o guerreiro vigorado

torna à guerra renomado

com redobrado ardor


eu, logo amáramos

desejo apenas dormir

no sonho fruir da poesia

(uma quadrinha que seja)

abraçar a eternidade

versejar em meio ao caos


dona, graça tal me cedes

por este amor, me enlaça

pois se me caça a guerra

apresso o verso opresso

faço da alegria bandeira 

da nossa cama trincheira