sábado, 15 de março de 2025

está na hora

 

Imagem gerada pelo ChatGPT


está na hora

da democracia romper as algemas

abrir os armários, deixar o vento levar

o pó dos coturnos que inda pisam nossa história

está na hora

de apagar do currículo das academias

as lições de medo e silêncio

de plantar nas cabeças dos quartéis

as sementes da civilidade.

está na hora

de viver para além do golpe,

do autoritarismo que assombra

das torturas que ecoam

das mortes que clamam: nunca mais!


o brasil, com sua dança,

sob a brasa do olhar dos cachorros loucos,

quer transformar pendengas em passos

soberania em abraço

dialógo em ponte

cooperação em festa mas

surja alguém

trazendo nas mãos os impasses

e ameaças nos dentes

erga-se da justiça a clava forte

a luz que corta a escuridão…

não fugiremos pois

não tememos quem cultua a morte,

o brasil conhece seu direito de existir

junto e misturado

no carnaval em que somos inventados

onde a diversidade não é máscara

para esconder desigualdades

nem sombra para ignorar conflitos.


 

sábado, 8 de março de 2025

hoje

 

O que torna as casas de hoje tão diferentes, Richard Hamilton, 1992



hoje, ah hoje…

nem bem acordo o celular dispara

a promoção do dia, o desastre

a falcatrua, a mentira

o imbróglio político, o escândalo

o joguinho que interrompi ontem…

frequência cardíaca a mil,

glicose no teto, bolsa cai…

funerária boa viagem fez uma ligação perdida, ah!

antes que’u esquente ovos pro desjejum

a ia me avisa da teleconsulta

para implorar cardio que

avalie o risco cirúrgico

de uma inevitável remoção de catarata…

em meio a tal burocracia me assalta um pensamento:

pobre burro num corre insano

através de florestas em chamas, terremotos

tartarugas engasgadas com canudinhos de plástico

tô nem aí e améns

a fugir de tigres e tubarões famintos mas

ainda vivo e a ver o burro, zurro e açoito:

no dia derradeiro finda o poema,

a não ser que alguém decida repetir

ou dar continuidade ao verso


 

sábado, 1 de março de 2025

o colonialista

 

Colonização da América, Carlos Latuff, 2008


ontem entrei na vossa terra

fugido de outros fortes

que minhas ideias perseguiam…


e, agora, perseguido por vocês

galopo furtivo nesta terra

que ainda não é minha mas

pela graça da divina promessa

me foi destinado este chão

o chão que ocupais, para nele edificar

um reino digno da excelsa glória


porque me perseguem então, ímpios -

não ouviram o chamado que o deus fez a mim?


dele trago o dever de aniquilar todos vocês

mas por minha sapiência e benevolência

poupo os frágeis – mulheres, velhos e crianças,

os confino em terras fracas para que não prosperem

e não alimentem a vingança dos ancestrais


mas, vocês ainda me perseguem

não mais bravos guerreiros

mas fantasmas, assombrações

miríades de choros, lamentos, gritos

agonia que ecoa a calada dor

à custa das armas, doenças, drogas e dinheiro