sábado, 23 de setembro de 2023

bonito é nascer

 

Sol Nascente, Anton Prinner, 1944



luzes na cidade

transição: meia-noite

dois mundos em fricção


mortiços olhos buscam

o horizonte desde cá

coroado de ausências


pular a janela

correr rua afora

incomodar o silêncio…


distante o grito

tudo é vazio

tudo é lugar…


daí o retorno

cicatriz adoçada

eterna no punho


começar de novo

livre é a dor

e a graça do poema


meia-noite:

cidade acesa

tão bonito nascer


 

sábado, 16 de setembro de 2023

sempre indo

 

Onde Ir, Alberto Sughi, 1992



todos foram embora
restaram os fantasmas…
e eu
tenho dispensado companhia 

falta vontade
de olhar as frestas,
as réstias
as sombras e os contrastes 

nunca fiz piada de mim mesmo
levo a sério decifrar poemas,
eu, esse rascunho 

todos foram embora… 

o protocolar “como vai”
me desgosta
como?
se sempre vou indo


 


 

sábado, 9 de setembro de 2023

gula

 

 


Êxtase, Lajos Gulácsy, 1908



deus meu, acorde os orixás:
que vejam o corpo lindo do meu amor
e sintam seu cheiro doce
tal qual doce de batata doce
e abençoem
o corpo do meu amor
essa mesa farta, epifânica
ora, romeu e julieta
ora, queijo de coalho com carne de sol
cuscuz com ovos mexidos
sarapatel, baião de dois,
fritada de siri, galinha de cabidela,
café com leite e mel
acarajé, abará, caruru, vatapá e caldo verde
mousse de maracujá, suco de graviola, cajá
laranja, manga, caju e jambo
licor de jenipapo, capuccino com amarula
e muita música brega após às 10 da noite...
e abençoem também o sono das crianças
para que nós, em ritual
morramos e ressuscitemos
antes que a fome
mais um dia
nos acorde