Um pescador, Tarsila do Amaral, 1925
A
professora Marialva – galega apessoada e ferina nos olhos, aceitou
trabalhar na Beira dos Macacos depois de descobrir que o lugar tinha
o que mais desejava na vida: praia, brisa e sossego.
Alugou
uma casinha e decidiu que ali, naquele povoado de gente fina, criaria
seu filho, cuidaria de uma horta e, quem sabe, morreria, um dia, nos
braços de um homem gentil.
Na
sala de aula insistia em preparar trinta alunos para um mundo em
construção, enquanto nos dias de folga se estirava na alvíssima
prainha do Bororé a ouvir a alegria do seu menino, na prancha, a
ensaiar manobras nas suaves ondas que rebentavam próximas aos seus
pés.
Em
todo idílio habita uma serpente. E Marialva enxergou um homem (??)
se masturbando ao lado do coqueiro seco. Seus olhos longínquos
doeram. Por que cada centímetro a descoberto do corpo de uma mulher
é um chamado à pornografia? Humilhada, chamou o filho.
Foi
falar com o cabo do destacamento, ali, na porta da bodega. Por três
vezes fora alvo de lascívia, disse. Sentia-se vulnerável, reforçou.
O militar falou que estava anotado e que ficasse tranquila,
investigaria.
Em
casa, toda noite ao botar o menino para dormir, encafifava: Ousaria o
tarado aproximar-se, tocá-la? Começou a ter insônia.
Um
dia decidiu que levaria suas preocupações até onde fosse possível.
E foi à pracinha conversar. Falou com um, com dois… falou com
tanta gente e não encontrou jeito de se sentir segura. A situação
piorou quando viu o tal homem e o fardado, ridentes, partilharem uma
meiota de cachaça.
Investigou
por conta própria: o sujeito era capataz no sítio Belo Coco,
casado, três filhos… Procurou a esposa. A pobre não acreditou e a
expulsou aos berros - “Em nome de Jesus, meu marido é pessoa de
bem. Como posso acreditar em ti, mulher sem homem?!”
-
Procura o Biu, alguém disse baixinho e passou-lhe a visão.
Marivalva decidiu que se os costumes estavam jogando contra ela
usaria um coringa: buscou Nego Biu.
O
chefe do tráfico disse que ficasse de boa que, por seus olhos
verdes, por seu porte, seu trabalho, sua palavra, daria seu jeito e
desapareceu sonhando com a professora casada com seu irmão pescador.
Na
Beira dos Macacos nunca mais se viu jacaré brechando as
mulheres nas praias. Ninguém morreu. O tarado foi mandado pros
cafundós dos judas, com um selo na testa…
Na
festa de Iemanjá, Marialva conheceu Deolindo e se apaixonou pelo
perfumado jangadeiro.